terça-feira, 18 de dezembro de 2007

Entrevista a Natália Reis

Das terras frias do Norte de Portugal surge-nos um novo talento literário que nos aquece com as suas palavras. Natural de Vila Nova de Gaia, Natália Reis com apenas 18 anos, vê em 2007 o seu primeiro livro “Incongruências da Alma” ser publicado.
O Metal Wood não deixou passar despercebido o facto de Natália ser uma das nossas users, e como tal teve um pequeno “chit-chat”…


Como é que tudo começou?
Tudo começou quando ainda andava na escola primária, a professora perguntou-nos o que queríamos ser quando fossemos grandes. Eu cheguei a querer ser cabeleireira, mas depois cheguei à conclusão de que o que queria mesmo era ser escritora. Desde novinha que leio muito.

Esse gosto pela leitura foi porque te incentivaram a ler?
Não propriamente. Não senti grandes incentivos, não houve grandes estímulos exteriores. Lembro-me de ter ouvido dizer que fazia bem ler, que desenvolvia muitas capacidades e como até era uma criança pacata decidi começar a ler.


Envolves-te muito naquilo que lês?

Envolvo-me muito, completamente, gosto de sentir os livros, de os cheirar, ando sempre com um caderninho para transcrever frases que me despertem a atenção.


Esse sentir foi o suficiente para te impulsionar a escreveres, de que modo é que este cativou-te para a escrita?

Acho que esse processo não ocorreu de forma linear nem é fácil dissociar as duas coisas. Quando leio muito, sinto uma extrema necessidade de escrever. Às vezes abro um livro numa página qualquer e olho para uma palavra ou uma frase e a partir dela começo a escrever algo, pode não ter nada a ver com o que estava escrito, com o que li, mas surge a partir dali.
Há aquela necessidade de criar, de dar forma a determinada ideia ou então nem há ideia. Acho que a minha escrita funciona muito em torno da articulação entre as palavras.


As palavras inspiram-te, e o que mais?

Para além das palavras a inspiração advém de muitas outras coisas, as pessoas, os lugares. Gosto muito de observar de me perder em pormenores, sou capaz de ficar a olhar para um objecto banal e contorná-lo, modificá-lo mentalmente. Uma musica é capaz de me 'inspirar', as cores, a natureza, os gestos e as falas de outrem.


Quais as tuas principais influências?

Na poesia Fernando Pessoa, Florbela Espanca, Sophia de Mello Breyner, Al Berto.
Na prosa não tenho assim muitas influências gosto de ler de tudo, gosto da Natália Correia, José Luís Peixoto, varia um bocado.


Como referiste, absorves as coisas e situações, e o que é que dás de ti, que parte da Natália é visível e identificável naquilo que escreves?

Ora ai está algo que tenho vindo a tentar perceber. O que dou de mim. Não percebo muito bem até que ponto não me dou a mim própria nas palavras.


Mas há um dar, certo?

Sim, é inevitável, não digo que seja uma escrita autobiográfica porque não o é, no entanto muito do que sou está lá na medida em que o sentir muito, o pensar muito, o permanecer e o transformar estão lá.

Quer dizer então que sentes que te entregas mas não propositada ou conscientemente?
Sim, supostamente as emoções poderiam ser totalmente filtradas mas há sempre essa carga emotiva, às vezes sinto um desespero imenso quando estou a escrever.


Tu tens o privilégio de teres conseguido publicar um livro muito nova, como é que surge o "Incongruências da Alma"?

Quando escrevi o primeiro poema que fez depois parte do livro, não tinha em mente esse conjunto final, muito menos o título, foi tudo muito natural. Vi-me com umas boas dezenas de poemas, era nova, achava que estava bom, agora também acho mas mudaria muitas coisas. A escrita evoluiu e há ali muita coisa que hoje acho fraco. Juntei tudo ficava uma compilação agradável, mais tarde notando a discrepância de sentimentos ali patentes, achei que a palavra incongruências faria todo o sentido.


Como é que tu vês a tua geração daqui a uns anos, geração esta influenciada por morangos com açúcar e MTV, achas que num futuro próximo irão permitir a descontinuidade e o embrutecimento social, achas que haverá solução?

Preocupa-me e já pensei nisso muitas vezes. Hoje em dia é difícil encontrar quem consiga escrever frases de forma correcta e o uso dos 'x's é exagerado. Acho muito sinceramente que daqui a uns anos isto estará pior, porque com maus exemplos a tendência é para piorar. Quanto a uma solução, não vejo qual poderá ser. O plano nacional de leitura deveria ser uma boa ajuda, porque de facto incutir nas crianças o gosto pela leitura seria a pedra basilar.


Quanto à publicação do livro, foi difícil o momento de partilha com outras pessoas?

Isso é engraçado porque eu ansiei pelo momento da publicação mas quando ela aconteceu, fiquei com um certo receio da opinião, da exposição, acabou por ser assustador.
Requer uma fase de adaptação sair daquele silêncio.


O processo de "encontrar" editora foi muito penoso?

Não foi muito difícil, até porque mandei para algumas ao mesmo tempo. A editora que me publicou, conheci através de uma apresentação a que fui e, supostamente eles dedicam-se a publicar autores em inicio de carreira.


Visto Portugal ser um país "ingrato" no que toca aos criadores literários e ao interesse pela leitura, ou seja é muito difícil alguém viver da escrita, achas que com as tuas capacidades e apetências na escrita se a tua publicação acontecesse num outro pais europeu, seria diferente? E já agora, gostarias de ver a tua obra (e futuras obras) traduzidas para outras línguas?
Acho que é muito difícil viver da escrita, talvez não seja só aqui mas em todo o lado. No entanto não é impossível. Talvez se fosse num outro pais algumas das questões que dizem respeito à edição, questões contratuais, não fossem tão estranhas, mas não posso assegura-lo.
Em relação a uma tradução, acho uma visão interessante se estivéssemos a falar de um romance mas em relação à poesia faz-me um bocado de confusão, porque muito ou quase tudo está relacionado com a língua, a forma, o ritmo, a rima, os sons.


Porquê a insistência e preferência pela poesia, pensas no futuro explorar outras áreas?
Sim, neste momento ando a escrever um romance e tenho alguns contos escritos. O que dou a conhecer nos blogues são poemas e por vezes excertos de prosas poéticas, que por uma questão prática não são desenvolvidos nesse espaço. Talvez por isso a sensação que não escrevo mais nada.


Ainda bem que mencionas o blogue. A escrita que nos apresentas difere muito daquela com que nos regalas no teu blogue. Para quando o arriscar naquela escrita mais desprendida?

Muito do que tenho no blogue tenciono pôr em livros, aliás escrevi com esse intuito e pus no blogue só para dar a conhecer e receber algumas opiniões. Há lá excertos pequenos de coisas que fazem parte da tal prosa que tenho escrita.
A escrita do meu blogue é diferente por uma simples razão é actual, e o que escrevo agora é muito diferente do que figura no livro. A poesia está mais evoluída, dou mais importância a algos que antes não dava.


O que achas de toda esta proliferação que se verifica nos blogues? Hoje em dia qualquer pessoa pode publicar o que quiser, independentemente da qualidade. No meio de tanta coisa como saber distinguir o que é realmente bom? Será que depois de tanta saturação dá para distinguir o que é realmente bom?
Eu achava que o meu curso me puderia ajudar nisso, até porque debatemos essa problemática -o que é a literatura, o que distingue uma boa obra literária de uma que o não é de verdade.
Cheguei à conclusão que está quase tudo nos recursos, na forma aliada a um bom conteúdo. O conseguir exprimir uma ideia através de palavras que se tornam música, a riqueza vocabular aliada a um articular natural, quase como se uma palavra se devesse seguir a outra.
Também depende do que queremos, se queremos uma historia que prenda e valha por si mesma ou se queremos uma linguagem mais poética, que nos embebede.


Mas tu no papel de leitora, como é que vês esses blogues. Há qualidade ou os facilitismos que este proporciona aliado aos comentários nem sempre sinceros, ilude a pessoa a pensar que sim?
Eu acho que há muita ilusão. Quem escreve está muitas vezes convencido de que o faz bem, e os comentários são normalmente positivos porque são de pessoas conhecidas, e todos se bajulam uns aos outros a fim de se tornarem todos leitores assíduos uns dos outros, é um ciclo que nunca mais acaba. É difícil encontrar-se um blogue bom.


Como é que defines a tua escrita?

Esquizofrénica, fluida, pura, relativamente natural...etérea


Segundo sei tens mais um livro de poesia, para ser publicado. Já tens alguma editora interessada?

Só há pouco é que o mandei e foi só a duas, por isso ainda não sei de nada


O que pensas fazer no futuro?

No futuro tenciono continuar a escrever, espero eu, mais e melhor. Aprender sempre e abranger mais coisas.


Para finalizar, quando é que nos fazes uma à Madeira, e já agora deixa alguma mensagem aos leitores madeirenses que possivelmente irão ler esta espécie de entrevista.

Quando eu for ai talvez me inspire, isso parece muito bonito, a minha mensagem é esperai pois eu hei-de referir a ilha num dos meus livros e há-de ser um best-seller.






www.incongruenciasdalma.blogspot.com
www.sepulcrodaspalavras.blogspot.com




2 comentários:

Mortisa disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Mortisa disse...

Natália,
obrigado pela entrevista e pela paciência demonstrada.
O teu Percurso será por nós acompanhado. :)